"Todo aquele que ler estas explanações, quando tiver certeza do que afirmo, caminhe lado a lado comigo; quando duvidar como eu, investigue comigo; quando reconhecer que foi seu o erro, venha ter comigo; se o erro for meu, chame minha atenção. Assim haveremos de palmilhar juntos o caminho da caridade em direção àquele de quem está dito: Buscai sempre a Sua face."

Agostinho de Hipona



segunda-feira, 7 de novembro de 2011

A conversão de Saulo, conversão pela graça

Para ler: Atos 9:1-31

Segundo John Stott em sua série intitulada: A Bíblia Fala Hoje, A Mensagem de ATOS Até os Confins da Terra, o Apóstolo Paulo quando de sua conversão, estabelece que “ a graça de Deus o capturou, inundou seu coração e o inundou como uma enchente”. Ainda segundo ele, “essa variedade de imagens lembra outra série de metáforas usadas por C. S. Lewis nos últimos capítulos de sua autobiografia. Sentindo que Deus o buscava implacavelmente, ele o compara com o “grande pescador” fisgando seu peixe, a um gato caçando um rato, a um bando de cães de raça encurralando uma raposa e, finalmente, a um enxadrista divino colocando-o na posição mais desvantajosa, até que, enfim, reconhece o “xeque mate” “ ¹.

De fato a graça de Deus é soberana, pois, “nEle vivemos, e nos movemos, e existimos, como alguns dos vossos poetas têm dito: Porque Dele também somos geração (At. 17:28). E ainda mais, “Assim, pois, não depende de quem quer ou de quem corre, mas de usar Deus a sua misericórdia (Rom. 9:16) quando o Apóstolo Paulo se refere a doutrina da eleição. Contudo, embora a atração de Deus seja irresistível, Seus desígnios sejam insondáveis e imutáveis, quanto à conversão a Cristo, cabe ressaltar certos esclarecimentos. Vejamos o que John Stott sabiamente considera tomando como base a conversão de Saulo de Tarso:  

[...] Entretanto, creditar a conversão de Saulo à iniciativa de Deus pode, facilmente, causar-mal entendidos, e precisa receber dois esclarecimento: a graça soberana que conquistou Saulo não foi repentina (no sentido de que não tenha havido preparação anterior) nem compulsiva (no sentido de que ele não tinha opção).
[...] Resumindo, a causa da conversão de Saulo foi graça, a graça soberana de Deus. Mas a graça soberana é uma graça gradual e suave. Gradualmente, sem violência, Jesus picou a mente e a consciência de Saulo com seus aguilhoes (v. 5). Então ele se revelou através da luz e da voz, não para esmagá-lo, mas de um modo que Saulo pudesse responder livremente. A graça divina não atropela a personalidade humana. Pelo contrário, faz com que os seres humanos sejam verdadeiramente humanos. É o pecado que encarcera; a graça liberta. Portanto, a graça de Deus nos liberta da escravidão do nosso orgulho, preconceito e egocentrismo, fazendo-nos capazes de nos arrepender e crer. Não podemos fazer outra coisa, senão engrandecer a graça de Deus que teve misericórdia de um fanático enfurecido como Saulo de Tarso, e de criaturas tão orgulhosas, rebeldes e obstinadas como nós.
C. S. Lewis, cuja consciência de ter sido perseguido por Deus já foi mencionada anteriormente, também expressou seus sentimentos de liberdade em resposta a Deus:
Conscientizei-me de que estava em apuros, segurando ou barrando alguma coisa. Ou, se você quiser, que eu estava vestindo uma roupa rígida, como um espartilho, ou talvez uma armadura, como se fosse uma lagosta. Eu senti, naquele exato momento, que eu tinha ganhado uma liberdade de escolha. Eu poderia abrir a porta ou mantê-la fechada; poderia tirar aquela armadura ou permanecer com ela. Nenhuma escolha era obrigatória; nenhuma ameaça ou promessa estava ligada a ela; apesar disso, sabia que abrir a porta ou sair da armadura significaria o incalculável. A escolha parecia solene, mas ela também parecia estranhamente não-emocional. Eu não era movido por desejos nem medos. Em certo sentido, não era movido por coisa alguma. Decidi abrir, soltar, tirar as rédeas. Disse “eu escolho”, mas ao mesmo tempo não parecia ser, mesmo, possível fazer o contrário. Por outro lado, eu não via nenhum estímulo. Você poderia argumentar que eu não era nenhum agente livre, mas estou mais inclinado a pensar que foi um dos atos mais livres que já realizei. Necessidade não precisa ser o contrário de liberdade, e talvez o homem seja mais livre quando, em vez de procurar motivos, ele pode dizer, “Eu sou o que faço”. [...]
[...] Conclusão
Consideramos as causas e efeitos da conversão de Saulo. O que mais nos impressiona é a graça de Deus que causou efeitos tão grandiosos, agarrando um rebelde obstinado com ele e transformando-o completamente de “lobo em cordeiro” ². A história de Lucas deveria persuadir-nos a pensar mais de Deus em relação aos incrédulos e aos recém-convertidos.
Quanto aos incrédulos, existem muitos Saulos de Tarso no mundo. Como ele, são intelectualmente bem dotados e têm caráter; homens e mulheres de personalidade, energia, iniciativa e impulso; tendo a coragem de suas convicções seculares; profundamente sinceros, mas profundamente enganados; viajando de Jerusalém para Damasco, e não de Damasco para Jerusalém; duros, teimosos, até mesmo fanáticos, em sua rejeição de Jesus Cristo. Mas eles não estão fora do alcance de sua graça soberana. Precisamos ter mais fé, mais expectativa santa, que nos levarão a orar por eles (como, com certeza, os cristãos primitivos oraram por Saulo) para que Cristo primeiro pique com seus aguilhões para depois agarrá-los definitivamente.
Mas nunca devíamos nos dar por satisfeitos com a conversão de uma pessoa. Isso é a penas o começo. A mesma graça que leva a pessoa ao novo nascimento é capaz de transformá-la à imagem de Cristo³. Todo novo convertido se torna uma pessoa transformada, e recebe novos títulos para provar esse fato: ele é um “discípulo” (v. 6) ou “santo” (v. 13) que tem uma nova relação com Deus, um “irmão” (v. 17) ou irmã que tem uma nova relação com o mundo. Se esses três relacionamentos – com Deus, a igreja e o mundo – não são vistos em um convertido confesso, temos boas razões para questionar a realidade de sua conversão. Mas sempre que sua presença for visível, temos bons motivos para engrandecer a graça de Deus.
Sola scriptura, sola gratia, sola fide, soli Del glória, solus Christus.
Notas:
1.    Surprised by joy, C. S. Lewis (Geoffrey Bless, 1955; Collins reimpressão, 1986) pp. 169-183.
2.    Calvino, II p. 273.
3.    E.g. 2 Co 3:18.           

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